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O fim do capitão ficou mais próximo
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Entrevista de José Luís Fiori para a jornalista Eleonora de Lucena.
Eleonora de Lucena: O que significam as mudanças ministeriais do governo Bolsonaro?
José Luís Fiori: Uma grande derrota do senhor Bolsonaro, seguida de um erro de cálculo clamoroso e passo em falso. O pano de fundo dessas mudanças é conhecido, e quase não precisa ser relembrado: a soma da catástrofe sanitária com o descalabro econômico, o isolamento internacional e a desintegração moral da sociedade brasileira. Mas, do meu ponto de vista, a mudança ministerial propriamente dita teve como objetivo encobrir a grande derrota do governo, que foi a demissão imposta do ministro de Relações Exteriores, o senhor Ernesto Araújo. As pessoas talvez não avaliem a importância deste senhor para o governo Bolsonaro, e por isso também não consigam avaliar o tamanho do tombo que a saída do chanceler representou para o governo.
Independentemente de tratar-se de um idiota quase inconcebível, o senhor Ernesto foi colocado onde estava para ter conexão direta com o governo de Donald Trump e como uma âncora capaz de assegurar o capitão contra as tempestades que ameaçariam seu governo, cuja ignorância e incompetência eram de pleno conhecimento do governo americano. Este contribuiu decisivamente para o golpe de Estado de 2016, e depois participou da operação de instalação do senhor Bolsonaro na Presidência do Brasil, mesmo sabendo que se tratava de uma pessoa inteiramente inepta e insana.
Além disso, Ernesto era o membro mais “ilustrado” da extrema-direita bolsonarista. No meio desta militância, Ernesto fazia papel do sábio idiota capaz de formular as idiotices ideológicas da extrema-direita em linguagem de “clube literário”. Sua importância nesse grupo era tão grande que mesmo depois da derrota de Donald Trump, a decisão era mantê-lo no governo. Já o Salles não passa de um lobista e pode ser escanteado a qualquer momento sem maior custo para o governo; e o próprio senhor Guedes deve ser desembarcado em breve, trocado por qualquer outro desses “gênios do mercado” que pululam pelas esquinas da Faria Lima e pelas páginas da imprensa conservadora.
A saída do “chanceler apocalíptico”, no entanto, teve, tem e terá um peso muito diferente na história deste governo. Por isso foi necessária uma pressão gigantesca de vários grupos de interesse e um golpe final do Senado brasileiro para enxotá-lo do governo contra a vontade do senhor Bolsonaro. E foi essa grande derrota que colocou Bolsonaro de joelhos e o levou a essa mudança ministerial, que não passaria de mais uma pantomima ridícula do capitão ofendido se não fosse o fato de que desta vez cometeu vários erros de cálculo estratégico que poderão ser definitivos para o futuro do seu governo.
EDL: Que erros foram estes, e como o senhor avalia os novos ministros?
JLF: O primeiro grande erro do senhor Bolsonaro foi ter “aberto o jogo” antes do tempo, deixando que todos vissem que não dispõe neste momento de mais do que um “par de setes’’, como se diria no jogo de pôquer. Sofreu uma grande derrota e tentou ocultá-la com uma grande ofensiva e acabou parindo um rato, e além disto todos viram que ele não dispõe de mais ninguém disposto a ir para seu governo que não sejam figuras inteiramente desconhecidas e despreparadas, saídas da roda íntima de sua família e de suas tertúlias e churrascos de quintal nos fins de semana tediosos de Brasília.
O que ele fez foi um troca-troca com seus militares de pijama e de confiança, e trouxe três pessoas novas com quem pouco menos que tropeçou no corredor: um funcionário do cerimonial do palácio que foi alçado à condição de novo ministro de Relações Exteriores, sem nunca ter sido embaixador ou feito uma carreira diplomática.
Numa escolha do tipo “se não tem outro, vai tu mesmo”, de uma pessoa que não tem currículo, abandonou a carreira diplomática e dedica-se a ensinar “boas maneiras’ ao pessoal do Palácio, além é óbvio de ser amigo de um dos “filhos presidenciais”, e de ser um pouco mais “diplomático” que o Ernesto. Para o Ministério da Justiça, trouxe um delegado de polícia de Brasília mesmo, da “bancada da bala” e obviamente amigo de mais um de seus filhos. E para a Secretaria de Governo, indicou uma deputada que está no seu primeiro mandato, também por Brasília e que foi indicada pelo presidente da Câmara, tendo sido eleita na vaga do seu marido que estava preso ou sob julgamento por ocasião das eleições.
E seu principal título, segundo dizem, é saber organizar a distribuição dos recursos do Orçamento entre os pedidos e favores dos membros do Centrão, isto é, sem demérito de uma pessoa que não conheço, ser a secretária do presidente da Câmara junto ao Gabinete da Presidência e junto ao caixa do Orçamento da República.
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